domingo, 4 de setembro de 2016

Esquerdistas, comunistas e pouco democratas: a narrativa do "golpe" fora do Brasil

(Glenn Greenwald falando à CNN: suporte à narrativa de "golpe" com a mesma linguagem utilizada pelo PT. As legendas em português são do vídeo da internet do qual a imagem foi reproduzida.)

Volta e meia eu leio no Facebook que tal jornal ou tal governo estrangeiro condenou o "golpe" no Brasil. Mas a questão central é: qual jornal e qual governo estrangeiro.

A CNN fez uma longa entrevista com Glenn Greenwald, um premiado jornalista. Quando vi a entrevista sobre o impeachment estranhei que ele utilizava exatamente na mesma linguagem do PT. Fui dar uma rápida investigada e descobri que Greenwald tem um marido brasileiro militante do PSOL. Nesta eleição David Miranda é candidato à vereador pelo Rio de Janeiro. Isto não prova a posição de Greenwald, mas não parece coincidência.

Noam Chomsky fala por si: ele foi uma das estrelas do Fórum Social Mundial em Porto Alegre. Para ele Dilma sofria impeachment (a declaração foi em 17 de maio, pouco depois da presidente ter sido afastada) por uma "gangue de ladrões" implicados em muitos escândalos de corrupção, e que os eventuais erros de Dilma "certamente não justificam o impeachment". Conclui-se, portanto, que seu impedimento é ilegal.

(Sede do The New York Times, em Nova Iorque: imprensa de esquerda no meio americano.)

The New York Times é um dos jornais mais esquerdistas dos EUA e reconhecido pela opinião pública americana como notório aliado do Partido Democrata. O jornal não chega a falar em "golpe", mas joga a culpa da crise política mais sobre a Câmara dos Deputados do que sobre o governo petista. Foram divulgados editoriais sobre o tema nos dias 20 de março ,19 abril, 12 de maio, 6 de junho, 17 de agosto e 31 de agosto, respectivamente após a grande manifestação de março, a votação da Câmara, a suspensão do mandato de Dilma, o início do governo Temer, a manifestação de agosto e o impeachment. Com exceção do primeiro editorial, a sequência dos demais apresenta o seguinte conteúdo: Dilma não cometeu crimes para sofrer impeachment; sua punição é desproporcional aos erros que cometeu; os que realizaram o impeachment (e grande parte da classe política) estão envolvidos em escândalos de corrupção piores do que a presidente; estes mesmos políticos estão se aproveitando da situação para tira-la do poder e estancar a Operação Lava-Jato; e o regime democrático do Brasil está em risco. O editorial de 17 de agosto é enfático: "as investigações não encontraram evidência de ações ilegais por sua parte [de Dilma]. E enquanto sem dúvida ela é responsável pelas políticas e muito pela má administração que levaram à queda da economia do Brasil, estas não são ofensas passíveis de impeachment." Para The New York Times, o processo "não é tecnicamente um golpe", como diz o último editorial, mas na prática é isto mesmo o que aconteceu. Suas posições foram um deleite do jornal eletrônico de esquerda 247 que destacou diversas vezes a posição de seus colegas nova-iorquinos.

(Atores do filme "Aquarius" protestando em 17 de maio no Festival Cannes: tentativa de propagar a narrativa de que havia um "golpe" em curso no Brasil.)

Le Monde, jornal francês de posição de esquerda, deu espaço para um manifesto redigido por senadores e alguns deputados, a maioria pertencente ao Grupo Comunista, Republicano, Cidadão (CRC), em que dizem que Dilma é vítima de um "golpe baixo parlamentar" e condenam o governo Temer como sem legitimidade e "composto exclusivamente por homens, sem nenhuma representação da diversidade que compõe a sociedade brasileira". O manifesto exalta o governo petista e mente ao dizer que Temer acabou com os programas sociais.

The Guardian é o jornal mais de esquerda dos grandes veículos do Reino Unido, como mostram as pesquisas de opinião sobre a posição política de seus leitores. Dentre colunas sobre o impeachmnt da Dilma, uma delas foi escrita por ninguém menos do que David Miranda, o marido de Greenwald, que acusa a mídia (leia-se Rede Globo) e a elite brasileira de induzirem a população a rejeitar a presidente e utilizar a corrupção como pretexto para tirá-la do poder. Noutra coluna, Paulo Pinheiro, ex-membro da Comissão Nacional da Verdade em 2012-2014 no governo Dilma (que investigava apenas os crimes cometidos pelo regime militar e ignorava o dos terroristas de esquerda), diz que uma elite "ultraconservadora e corrupta" chegou ao seu objetivo, que é a hegemonia política no Brasil. Acompanhando os colunistas do Guardian temos a impressão de que no Brasil ocorreu mais do que um "golpe", mas uma feroz luta de classes contra uma presidente "vítima" de suas realizações.

(Vladimir Putin com a agora ex-presidente Dilma: além da aliança pelo BRICS e defesa da mídia russa, o governo Dilma era apoiado por partidos de esquerda com vínculos diretos com o Kremlin.)

Na Rússia toda a imprensa fala em "golpe", e também dispensa comentários devido ao seu comprometimento com a linha do Kremlin. O canal Russia Today diz que não havia justificativa para o impeachment, a opinião pública fora manipulada e que os EUA poderiam estar por trás do "golpe", sendo Temer um suposto "informante" de Washington. Russia Beyound the Headlines disse ainda em maio, quando Dilma foi removida do cargo, que este ato, mesmo que "controverso", era um "golpe" condenado por vários países latino-americanos (aliados do PT). A agência Sputnik, claramente alinhada com a ideologia eurasiana, chama o impeachment de "golpe" e diz também que os EUA influenciaram o processo enviando em abril documentos sobre a Petrobrás a deputados de "extrema-direita", e estes atuaram no comitê do Congresso Nacional que aprovou o andamento do impeachment.

Li também no Facebook um comentário de que o Parlamento Europeu fez uma moção contra o "golpe" no Brasil. Mentira. Quem fez foi a coalização de extrema-esquerda GUE/NGL composta por partidos comunistas e esquerdistas, muitos deles vinculados à rede de contatos que a Rússia espalhou pela Europa. Dentre estes estão Sinn Féin da Irlanda, que atuou na luta armada na Irlanda do Norte, o recém fundado Podemos da Espanha e o Syriza na Grécia, este último firme aliado de Putin (pretendo escrever sobre isso com mais detalhes no meu blog "A Rússia e o mundo").

Já a denúncia do "golpe" por parte de Venezuela, Cuba, Bolívia e Nicarágua não é necessário comentar. Todos já sabem quem são os governos destes países.

Quem fala em "golpe" fora do Brasil, ou é esquerdista, ou comunista, ou não é exatamente um exemplo de democrata.

Nenhum comentário:

Postar um comentário