sábado, 24 de dezembro de 2022

Feliz Natal | 2022

          Creio que o Cristianismo jamais será compreendido enquanto não for visto como realidade, e não meramente fé, como se essa fosse distinta do próprio mundo em que vivemos e, pior, como se fosse alheia à razão. Jesus Cristo é uma realidade, Seus milagres são realidades, Sua morte e ressurreição são realidades, Sua presença em pessoa na Santa Comunhão é uma realidade!

          O Natal, portanto, não é simplesmente história e tradição. É fato. É acontecimento!! E o mais impressionante é que Jesus, sendo Deus, que é o Eterno, o Infinito, o Absoluto, teve a infinita humildade de vir ao mundo e entrar na História como uma criança nascida numa estrebaria. Querem coisa mais chocante do que o Todo-Poderoso vir ao mundo da forma mais humilde possível? E mais, porque Ele quis? Porque foi Sua vontade? Ele poderia ficar lá, na Sua Glória, sorrindo eternamente para si mesmo.

          Mas não. Ele escolheu o amor. A maior prova de amor que o Natal traz é que um Ser tão poderoso se fez infinitamente pequeno por causa nossa, minha e sua. Ele se importa contigo. Isso é amor, meu camarada. Proporcionalmente você não é nada para Deus, mas por amor você é tudo para Ele. E Ele, ainda por cima, preparou-se por 33 anos para derramar todo o Seu sangue por você na cruz.

          O Natal é a celebração do amor mais profundo, mais largo, mais infinito que transcende a nossa inteligência. O amor de Jesus, de Deus, por nós é inimaginável! Absolutamente inimaginável!! Só o amor infinito seria capaz de cobrir o abismo intransponível entre a infinitude divina e a finitude humana. E Nosso Senhor Jesus Cristo, como Menino, cobriu esse abismo. O amor de Jesus por você é infinito, e por isso mesmo capaz de cobrir toda e qualquer distância, toda e qualquer solidão, toda e qualquer treva. O resto não importa. Só Ele importa. Só a Sua Pessoa, o Seu Amor importa. Tudo o mais é consequência.

          FELIZ NATAL!!

sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

O paradoxo da luz

 

          Poucas coisas me deprimem mais do que aqueles dias de calorão intenso, céu limpo e luz estourada ao ponto de enrugar o rosto ao pô-lo pelo lado de fora da janela. O calor opressivo e úmido desanima o corpo, a ausência de nuvens dissolve a esperança e a luz intensa - além da radiação emanada dessa mesma luz e que provoca o calor - exige proteção que, começando pelos olhos, acaba por puxar o corpo inteiro ao recolhimento.

          Psicologia à parte, tenho repulsa a essa experiência típica de final de ano e início das chamadas férias, onde a sociedade brasileira, refratária a tudo o que diz respeito à vida interior e ao senso mais básico de realidade, se joga ansiosamente ao culto de tudo o que essa época representa, virando a ordem de cabeça para baixo na medida em que a temperatura sobe. 

          Opressão, mal-estar, depressão e dispersão. Um caldo perfeito para os fracos de espírito se deixarem levar pelos três primeiros e, ao bater do desespero, se jogar de cabeça no quarto. Não por acaso o carnaval, tomado como o ápice de nossa "cultura" e "diversão", foi alçado às alturas muito além da festa da Páscoa no país que se ufana em dizer ser o "mais católico do mundo".

          Mas hoje, em meio à luz estourada do início de dezembro, vi outra luz. Não necessariamente com os olhos, pois os olhos veem o mundo, mas aquilo que a alma contempla e podemos chamar de graça. E essa graça não seria alcançável se o mundo não fosse também simbólico transcendente à sua forma imediata.

          A luz que cega é a mesma que ilumina, o calor que arde é o mesmo que dá a vida e a sensação de opressão que se abate é a mesma que nos impulsiona à vida interior. 

          Me recordo de uma viagem recente em fins de outubro quando voltava de Gramado para Porto Alegre num dia de céu limpo, e meu padrinho de crisma comentava sobre a luz forte já no miolo da primavera. Partindo dessa luz tropical intensa, dizia ele que os pintores europeus tinham à sua disposição a luz do sol das regiões de clima temperado, o que lhes conferia maior contraste de cores com as estações do ano. 

          Assim, se a luz menos intensa dá cores mais vivas, a luz mais intensa dá vida mais abundante, materialmente falando. Em ambos os casos ela realça a vida, ora pela estética, ora pela abundância.

          Mas a luz vai além do simbolismo, ela ilumina a alma, dá movimento e sentido à vida enquanto tal.

          São Boaventura chama Deus de Pai das Luzes, numa referência a Ele como origem da inteligência humana com sua capacidade de contemplar e transformar o mundo. Luz, aqui, é intelecção, inteligência, apreensão da realidade. Pois se a natureza não é apenas material, mas também simbólica, então ela nos diz muito mais do que a forma encerrada em si mesma. A natureza é o primeiro Evangelho, que nos exige contemplação e compreensão para uma vivência correta segundo a ordem estabelecida desde o Alto.

          Portanto, sem luz não haveria visão e, mais ainda, não haveria inteligência, atributo exclusivamente humano por graça divina. A luz compreende o tripé que permite o homem existir, ver e entender, e por isso mesmo se faz humano e tão próximo d'Aquele que o criou.

          Subitamente, a luz estourada desse início de dezembro que observei pela janela se transformou, por um instante, num chamado do Céu, como se dissesse: "Eu estou aqui". O ambiente opressivo se transformou em ânimo e força para um vida abundante, como se a radiação fosse transmutada em energia física, num alegoria da alma que se vivifica com a luz que vem do Céu.  

          Ninguém vive se não foi antes pensado pela mente divina. A luz é um fiat, o impulso vital que anima e dá a vida, como o ardente sol de verão que, paradoxalmente, ao mesmo tempo em que oprime dá a vida em abundância.