sábado, 24 de outubro de 2020

A origem da lei

 "A fórmula-raiz duma época é a lei que não está escrita, assim como a lei primeira entre todas as leis, responsável por proteger a vida contra o homicídio, não se vê escrita em lugar algum do Statute Book." (G. K. Chesterton, em "Eugenia e Outras Desgraças", 1922)

A proximidade entre as autoridades política e espiritual acabou por sacralizar o Estado, que na era modera emergiu como todo-poderoso das leis e dos princípios.
Nossa época herdou este vício de que a lei dos homens pode legislar sobre tudo. Não por acaso, há uma tendência de se considerar moralmente aceito aquilo que é legalmente estabelecido.
A sacralidade da vida pública foi transferida da Igreja para o Estado, o novo templo, sendo seu corpo jurídico o novo catecismo.
Ocorre que a lei dos homens é uma derivação da lei divina (ou ao menos assim deveria ser), e por isto mesmo a Santa Igreja, ao exemplo da encíclica "Dignitatis Humanae" de São Paulo VI, exorta os fiéis para que obedeçam à autoridade, desde que esta autoridade não vá contra a Igreja e os princípios que ela defende.
A lei, diz o documento, deve garantir a liberdade religiosa, pois Deus fez o homem livre para que Nele cresse. Assim, a lei dos homens deve estar em consonância com a Lei de Deus.
Chesterton evoca esta Lei superior em "Eugenia e Outras Desgraças", lembrando os dois primeiros mandamentos que, segundo o próprio Jesus, resumem toda a Lei de Deus.
Amar a Deus sobre todas as coisas é amar o próximo, pois Deus habita no próximo. Portanto, quem agride ao próximo agride a Deus em pessoa. E por isso mesmo amar o próximo como a si mesmo é amar a Deus. Não há como separar esses mandamentos, derivação de todas as demais leis divinas.
Assim, o que Deus proclamou não está nos Statute Books do Reino Unido ou na Constituição brasileira de 1988, mas no coração humano, e tem como veículo a Igreja através de sua Tradição, a Palavra e Magistério, ou mesmo outras tradições religiosas.
Nos dias de hoje, onde proliferam leis iníquas que atentam diretamente contra a vida e relativizam a dignidade humana através da segregação social e do consequente estímulo de conflito de todos contra todos, o homem tem o desafio de se aferrar à Lei inscrita no próprio coração e lutar para que, no momento oportuno, prevaleça nas cartas do mundo todo o que imperou nas sociedades cristãs por séculos. E o que impera no coração de Deus desde a eternidade.

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