terça-feira, 23 de junho de 2020

Nossa insistência no erro e o papel da providência


"Problemas humanos são, na maioria das vezes, de dois tipos: há o tipo acidental, 
que você não pode ver porque ele está tão perto que você tropeça nele co se fosse
um supedâneo; e há o outro tipo, o tipo real, o qual um homem buscará,
 (...) indo sempre mais para baixo, em direção ao abismo perdido." 
(G. K. Chesterton, em "Ortodoxia")

          A vida é sacrifício, esforço, luta diária.
          Todos os dias as pessoas enfrentam problemas que estão fora de seu alcance e cuja superação depende de calma e bom senso.
          Às vezes saímos e casa sem guarda-chuva, mas a chuva aparece inesperadamente; um acidente de trânsito engarrafa a cidade e nos atrasamos para o trabalho; comemos um pouco demais na noite anterior e acordamos no dia seguinte enjoados e com dor de cabeça.

          Estes são acidentes, situações cotidianas que fogem de nossa compreensão precedente, seja porque não tínhamos informações suficientes sobre o problema, seja porque estávamos desatentos.
          Mas há problemas que são muito mais do que simples problemas. Casamentos arruinados, envolvimento com o crime, ações mal-intencionadas ou uma vida inteira vivida sem sentido são, no fundo, deliberações humanas.
          Chesterton nos mostra nesta passagem que os verdadeiros problemas humanos são aqueles criados pelo próprio homem.
          Não que as pessoas queiram sofrer por querer, mas que nossos maiores problemas são justamente aqueles advindos de escolhas erradas. Mesmo as ações mal-intencionadas não visam o próprio sofrimento, pois a pessoa que escolhe este caminho perpetra um mal esperando com isso receber algum bem.
          Mas o orgulho humano, a insistente manifestação do pecado original coloca vendas em nossos olhos e nos torna incapazes de ver as reais consequências de nossos atos. O homem insiste no erro por vezes por má intenção, mas também pela cegueira advinda de seus múltiplos defeitos.
          Nossa constante corrida para o abismo corrige-se na tomada de consciência de nossa realidade e de um coração que reconhece em si a presença do Bem.
          Há algo profundamente paradoxal em errar com frequência e ainda assim o mundo sustentar-se acima do caos. A harmonia que subsiste pelas mãos da Providência é maior do que os erros humanos, porque os contém, os integra e, portanto, delimita-os, dotando-os de sentido ao situá-los num contexto maior.
          Uma abertura interior para a realidade exterior de nosso cotidiano, dentro da qual nossas decisões são tomadas, é a atitude que permite vermos nossos erros se integrarem na realidade e fazerem sentido, dotando os tortuosos e misteriosos rumos de nossa vida de um sentido mais amplo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário