domingo, 30 de agosto de 2020

Multidões solitárias

"O mal principal de nosso tempo é que a coletividade social tem fomentado a solidão espiritual. Nunca as pessoas estiveram tão acompanhadas e nunca as estiveram tão solitárias." (G. K. Chesterton) 

          A sociedade de massas é a sociedade do anonimato, da multidão sem rosto que fecha-se em si mesma para facilitar seus fins práticos.

          Esta passagem de Chesterton lembra os estudos do filósofo e sociólogo alemão Georg Simmel, que afirmava que o homem das cidades, local das massas por excelência, possuía uma atitude blasé, de relativa indiferença com relação ao próximo.

          Eliminada a vida comunitária, onde todos conhecem a todos pelo nome, pelos traços e pelos modos, somos obrigados, pelo próprio mecanismo da vida em sociedade, a ignorar estes mesmos nomes, traços e modos a fim de manter em funcionamento esta grande máquina sem rosto que é o mundo moderno.

          Porque nas cidades encontramos muita gente todos os dias, e é impossível tratar intimamente todos as pessoas; mas ao mesmo tempo temos de manter a civilidade para com o próximo a fim de tornar a vida suportável.

          Vivemos como se o outro fosse alguém de valor, por assim dizer, mediano a ser tratado para fins meramente utilitários.

          O próximo transforma-se em mais um em meio à multidão.

          E ninguém pode se sentir bem acompanhado por quem não tem rosto. Estar na companhia de um anônimo é mais ou menos como passear com uma estátua. Ou um poste.

          Chesterton traz esta afirmação com a experiência de quem viveu na Londres do início do século XX, então uma das maiores cidades do mundo.

          Ele viu, ele viveu numa sociedade massificada e viu a solidão rondar seu universo. E mais, viveu esta solidão.

          Numa era onde tudo se tornou coletivo, onde a ênfase no indivíduo desembocou na apologia aos objetivos meramente práticos e abriu as portas à engenharia social em larga escala, temos a falsa impressão de que podemos suprir nossa solidão com desejos pessoais e slogans midiáticos repetidos por todos ao mesmo tempo.

          Estamos só porque nos rendemos à massa. Olhar a humanidade no próximo é o primeiro passo para apagar a angústia e a tristeza de uma vida solitária.

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