Final de outubro, primavera, céu completamente azul. A pouco menos de dois meses do solstício de verão o sol brilha inclemente sobre a latitude trinta graus sul. Em termos de Brasil, onde grande parte do território está na zona tropical da Terra, estar nessa faixa é uma exceção, o sol é menos intenso em grande parte do ano em comparação às praias do Nordeste ou à vastidão do cerrado. Mas é possível notar claramente a força da radiação que desce sobre nossas cabeças. Bastam cinco minutos sob o sol do final da manhã para notarmos a condição de pré-assado de uma pessoa, que possivelmente mostrará em sua feição o quão desagradável é estar nessa situação, principalmente se sob algum tipo de obrigação.
Esse relato se torna mais trágico ainda quando quem o divulga é alguém que não só gosta do inverno mas que nos últimos anos pegou aversão ao verão, tanto pelos efeitos físicos que provoca sobre o corpo e a mente quanto pela "cultura" da época, uma mistura de loucura com arruaça, desrespeito e música ruim. Quando vejo o céu absolutamente limpo nesta extensa faixa de tempo que cobre o período de outubro a meados de março a primeira palavra que vem à minha cabeça é um palavrão, salvo os poucos momentos em que, mesmo estando ao nível do mar, a temperatura não ousa passar dos vinte e cinco graus. E também quando não sou obrigado a ficar ao ar livre mais do que cinco minutos.
A radiação inclemente do astro-rei é ainda pior nos locais de serra, onde a atmosfera menos espessa permite a radiação solar chegar à superfície com mais força. Mas radiação por radiação, basta uma boa sombra ou algumas nuvens para notar que essa mesma camada de ar mais fina permite que o calor emanado da superfície se retenha em menor intensidade deixando o ar mais fresco mesmo com a luz na voltagem máxima. Eu, que acompanho as condições do tempo na região onde moro, invejo os dias frescos e mesmos frios da primavera nas cidades que estão no local que forçosamente chamamos de "serra"- diga isso a um europeu e ele dará risada de nossas montanhas, miúdas perto dos Alpes.
Não posso deixar de notar, porém, que esse sol na cabeça não é de todo mal. Luz é vida, tanto que o próprio Deus é associado à luz, esse enigmático elemento da natureza que permite a tudo definir e reluzir frente aos nossos olhos exatamente como fez o Criador com sua Criação. Se a primavera traz a radiação inclemente, ela traz também a renovação, que explode em energia na época mais quente do ano até amortecer sua força e hibernar na metade do ano seguinte.
Como brasileiro sou muito feliz em poder testemunhar esse ciclo natural. Desgraça minha seria estar numa região onde o sol se faz inclemente todas as épocas do ano, seja no verão, por vezes aliviado pela estação chuvosa da região tropical, seja no inverno, época maldita onde todos os dias são igualmente radioativos e secos numa monotonia opressora capaz de deprimir um amante do frio só com a expectativa de sua chegada.
Apesar de abominar este sol na cabeça, vivo como o canadense da costa da Colúmbia Britânica ou o russo junto ao Mar Negro. Sou exceção. Não me peça para ficar na expectativa do "vem verão" ou me alegrar com o carnaval. Fico na expectativa da época que vem e que passa.
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