terça-feira, 12 de outubro de 2021

Dia 10 de outubro de 2021

          Ninguém é digno de elogio. No Evangelho, quando o jovem rico chama a Jesus de "Bom Mestre", Jesus lhe responde que só Deus é bom. Por que, então, haveria alguém de receber elogio igual ou melhor do que o atributo atribuído unicamente a Deus?

          Não podemos nos furtar, porém, de aceitar elogios, pois se Deus é bom e mais ninguém, o que quer que seja elogioso a Ele pertence. E a boa educação nos ensina a sermos generosos com ofertas, porque receber uma oferta é aceitar que o outro lhe faça o que você faria se estivesse no lugar dele guiado por uma boa intenção.

          Assim foi comigo neste domingo, quando alguém disse a mim que eu era uma pessoa "justa". Antes de mais nada, cabe lembrar que o que aqui escrevo não é uma autoexaltação ou bajulação, mas o relato de um fato que deu o que pensar. Quando vi que receberia um comentário amigável e amoroso esperava receber outra resposta que volta que se tornou, digamos, como em momentos pontuais de minha vida, como "inteligente" ou "bom" - sim, o atributo divino de novo - mas nunca "justo".

          O que me surpreende neste adjetivo é a grandeza do justo, a busca por aquilo que é certo e sua luta para evitar o errado. Só pessoas podem ser atribuídas como justas, no máximo um grupo de pessoas que lute de forma organizada por aquilo que é certo, jamais uma sociedade, pois sociedade enquanto agente não existe, e "sociedade justa" é apenas figura de linguagem usada ao longo dos últimos duzentos anos para justificar tiranias e genocídios.

          Mas nem mesmo a busca de alguém por aquilo que é certo faz dela uma pessoa justa. No emaranhado de decisões e pensamentos - muitas vezes injustos, basta meditar sobre nosso catálogo de ideias e imagens desejadas interiormente em diversas situações -, buscar a justiça é como embrenhar-se num denso matagal à noite guiado mal e porcamente por uma bússola desobediente e estrelas que insistem e se esconder por detrás das nuvens, chegando a resultados muitas vezes não esperados.

          De qualquer forma, é justo aquele que adentra o matagal na reta intenção em meio à tortuosa trilha. A justiça depende justamente da sabedoria, essa mescla de amor com inteligência, que guia as ações num mundo complexo e contraditório, mas que toma uma forma coerente - e justa - com o auxílio do Espírito. A caminhada do justo só é bem sucedida porque sabe de sua incapacidade de vencer o mundo, mas tem consciência de sua capacidade decisória de escolher o que é bom.

          Assim como no Evangelho, só Deus é justo. Ninguém tem a capacidade de, dentre emaranhados de obstáculos e contradições, vencer o mundo, mas tem o mérito - o único, diga-se - de escolher a coisa certa. Qualquer elogio além disso é atributo divino.  

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