Tenho o hábito - não muito recomendado - de encontrar um filme passando na TV a cabo e começar a ver pela metade.
Durante o almoço de sábado, trocando de canal, me deparei com o nostálgico Independence Day, o filme de 1996 que relançou o cinema-catástrofe como uma das franquias de Hollywood e que marcou memória com as cenas da destruição da Casa Branca e do Empire States por naves alienígenas que cobriam cidades inteiras. Virou uma das referência cinematográficas da geração que viveu no anos 1990, inclusive para mim, particularmente porque sou fã desta modalidade de filme - mas não posso me furtar de dizer que, à exceção desta obra, os demais filmes de Roland Emmerich são uma merda.
Ao longo do enredo, fui relembrando da época em que o filme foi lançado, as boas pessoas com quem convivi e as situações que deixaram em minha memória boas recordações. O cinema tem este efeito de recriar, tal como na música mas ao seu próprio jeito, o sentimento de nostalgia, de saudades do passado, reaviar o vínculo afetivo de lembranças carinhosamente guardadas e suspensas no tempo.
Demorei para notar que esse sentimento, recheado de conforto emocional e aparentemente agradável ao coração, pode não ser exatamente algo bom como parece à primeira vista. O conforto é uma sutil sedução da inércia que a situação sugere, um aburguesamento da alma sobre recordações do passado. A nostalgia transforma-se numa prisão confortável sobre a qual desejamos erguer um nova vida, arremessar lá do passado para o futuro uma época que não pode voltar jamais. Fixamos nosso olhar no tempo e passamos a acreditar que, motivados pela força do desejo, alguma força mágica reproduzirá no porvir o sonhado paraíso perdido. Nos tornamos escravos do próprio ideal cegos e seduzidos pelo seu efeito mais evidente mas enganador, o conforto, cuja consequência é outro sentimento, mas ainda mais enganador, o de aparente felicidade. No inferno, jaz a esperança.
Na época eu era incrivelmente ingênuo, acreditava realmente na natureza essencialmente boa das pessoas e me refugiava em sonhos e pensamentos íntimos. Este traço pessoal se aguçou com o tempo, mas acabou por criar uma barreira quase intransponível entre o eu ideal e o eu real. Enquanto via o filme e lembrava da época em que fora lançado, do que mesmo eu sentia saudades e queria reviver?
Dessa dúvida surge outra pergunta mais profunda: quando eu sonhava com algo do passado queria algo real ou algo que imaginava ser real? Se eu voltasse aos quinze anos, idade que eu tinha quando Independence Day foi lançado, gostaria de resgatar um pouco da pureza e, claro, de minha ingenuidade da época. Seria de enorme frustação e tristeza ser aquele garoto e me deparar com o irrealismo de meus sonhos e desejos tendo consciência do que aquilo resultaria no futuro e do hiato entre o garoto sonhador de ontem com o homem real de hoje.
Assim como as sequências cinematográficas nunca são iguais à primeira - Independence Day: Ressurgimento é uma bela porcaria digna de ser ignorada - nós jamais seremos como éramos antes. A tentativa de restauração de um sonho nostálgico é fadado à frustração e à infelicidade futuras. Mesmo que sejamos puros como crianças e vivamos algumas das coisas que passaram, nossa astúcia não é mais a mesma. Ela é, inclusive, necessária para que demos fim às frustrações de desejos não realizados e realizemos planos dignos de deixar um legado.
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