(Rússia e vodka: combinação que não é exatamente um estereótipo.)
Comecei as aulas de russo em agosto deste ano. Minha professora Elena é diretora do Instituto Cultural Russo. Nossas aulas ocorrem uma vez por semana, salvo percalços criados pela agitada agenda da professora.
(Letras e fonéticas do alfabeto russo.)
A primeira dificuldade é conhecer o alfabeto cirílico. O mais complicado no aprendizado para quem fala português não é, no meu entender, conhecer as trinta e três letras do alfabeto (alguma extremamente esquisitas, como o "jé", cuja escrita é um asterisco de seis pontas, ou o "iú", escrito como IO vinculados por um traço), e sim não confundir a letra de forma com a fonética em português. Por exemplo: a letra "H" tem som de "N" em português; o "N" invertido tem som de "I"; o "B" de "V", "Y" de "U"; e a escrita similar ao número "3" som de "Z". Tornar estas associações natura naturais sem confundir com a fonética do português dá frequentes curto-circuitos nos meus neurônios.
Mas como boa russa que minha professora é, natural da cidade de Krasnoiarsk no sul da Rússia, ela nos ensinou uma das coisas mais comuns do país: as bebidas. Estão lá os vinte nomes de bebidas listados em russo no meu caderno, da água ao conhaque. Elena nos contou que a imagem do russo beberrão de vodka é verdadeira, e que nos encontros sociais é extremamente comum o uso da bebida. É "tradição" entre os russos tomar a vodka em três pessoas, e a razão é bastante prática: depois de muitas doses alguém acaba tonto, incapaz de sair caminhando por aí, restando dois para ajudar. É comum ver na rua duas pessoas carregando um bêbado, como também são comuns os casos de atropelamento de pessoas sob efeito do álcool. Inclusive é pouco educado recusar uma bebida quando se é convidado a um encontro. Ser russo é estar realmente familiarizado com a vodka.
(Uma das vitrines da Rússia, São Petersburgo possui arquitetura essencialmente europeia. Em destaque a cúpula dourada da Catedral de Santo Isaac, de estilo neoclássico, ao contrário do bizantino das demais igrejas ortodoxas.)
Outro exemplo do comportamento dos russos tive na semana passada quando assisti a uma aula ministrada pela professora de literatura russa da UFRGS Denise Regina de Sales sobre a cidade de São Petersburgo. O tema era a cidade pela ótica de dois ex-moradores e famosos escritores: Nikolai Gogol (1809-1852) e Fyodor Dostoyevsky (1821 - 1881). Fui ao encontro mais atraído em conhecer a história da cidade do que a visão que seus famosos escritores tinha dela, cujas obras, confesso com um pouco de vergonha, ignoro por completo. Interessante notar que esta cidade, fundada em 1703 pelo czar Pedro, o Grande, rivaliza com Moscou não só como capital histórica do país, mas também por suas associações simbólicas e culturais. São Petersburgo é a cidade masculina, ocidentalizada, aberta, jovem; Moscou é a cidade feminina, propriamente russa, reservada e mais antiga.
(Gogol e Dostoyevsky: ex-moradores de São Petersburgo dão vida à cidade.)
Enquanto ouvíamos os trechos dos autores lidos pelos alunos da aula entrávamos e imaginávamos as cenas às quais Gogol e Dostoyevsky nos transportavam. Tive de ler dois trechos deste último, e fiquei impressionado com o mergulho que o leitor fazia no corpo do personagem bem como no ambiente físico. Brinquei por um momento que o aprisionamento emocional descrito pelo personagem de Dostoyevsky era angustiante e me levaria a ficar sem ar. Infelizmente não me recordo da fonte dos trechos. De qualquer forma a experiência foi muito válida porque me ajudou um pouco a ter uma breve ideia da dimensão do impacto da literatura russa do século XIX no mundo todo. e de minha ignorância sobre o tema.
(Gogol e Dostoyevsky: ex-moradores de São Petersburgo dão vida à cidade.)
Enquanto ouvíamos os trechos dos autores lidos pelos alunos da aula entrávamos e imaginávamos as cenas às quais Gogol e Dostoyevsky nos transportavam. Tive de ler dois trechos deste último, e fiquei impressionado com o mergulho que o leitor fazia no corpo do personagem bem como no ambiente físico. Brinquei por um momento que o aprisionamento emocional descrito pelo personagem de Dostoyevsky era angustiante e me levaria a ficar sem ar. Infelizmente não me recordo da fonte dos trechos. De qualquer forma a experiência foi muito válida porque me ajudou um pouco a ter uma breve ideia da dimensão do impacto da literatura russa do século XIX no mundo todo. e de minha ignorância sobre o tema.
(Pushkin: orgulho nacional.)
O que também chamou minha atenção foi, segundo os relatos, o valor que os russos dão à literatura e à cultura do país. Além da professora, muitos alunos já estiveram na Rússia. Um dos presentes comentou em dado momento que um amigo(a) em viagem ao país contemplou o busto de um homem num local público. Depois perguntou a uma pessoa próxima de quem se tratava. A pessoa ficou assombrada com a ignorância da pergunta. Ela não entendia como alguém não sabia de quem era a representação. O busto era do poeta Alexander Pushkin (1799-1837), nascido em Moscou e falecido em São Petersburgo, considerado pelo russos o maior de todos os seus escritores. Na medida em que a pessoa explicava à visitante quem era Pushkin, apareceu um policial para ver o que estava acontecendo. Mas o policial foi tragado pela conversa. Depois vieram outras pessoas e mais outras formando um aglomerado de indivíduos que discutiam em grupo quem era Pushkin. Isso denota que o poeta tem alguma fama em seu país de origem. Diria, pelos comentários da professora e dos alunos, muita fama.
É claro que os relatos acima não resumem quem são os russos, nem dão forma acabada a este povo. Associar russos com vodka e literatura é mais ou menos como associar brasileiros à samba e futebol. É uma associação meramente popularesca. Diz pouco sobre a sociedade, ou mesmo distorce sua verdadeira identidade. Vodkas à parte, quem dera fôssemos também nós apaixonados pelos intérpretes de nossa pátria, e não unicamente pelas diversões passageiras. Faria um bem danado à nossa mentalidade e à auto-estima. Mas resgatar uma cultura que foi substituída pelas paixões mais superficiais e efêmeras será um trabalho que levará gerações.
É claro que os relatos acima não resumem quem são os russos, nem dão forma acabada a este povo. Associar russos com vodka e literatura é mais ou menos como associar brasileiros à samba e futebol. É uma associação meramente popularesca. Diz pouco sobre a sociedade, ou mesmo distorce sua verdadeira identidade. Vodkas à parte, quem dera fôssemos também nós apaixonados pelos intérpretes de nossa pátria, e não unicamente pelas diversões passageiras. Faria um bem danado à nossa mentalidade e à auto-estima. Mas resgatar uma cultura que foi substituída pelas paixões mais superficiais e efêmeras será um trabalho que levará gerações.
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