Você está aí, no alto de um grande edifício. A brisa bate no rosto, o sol esquenta sua pele, nuvens algodoadas transitam lentamente pelo céu. Vez ou outra alguns pássaros atravessam o alto e soltam cantos e burburinhos em línguas não compreensíveis. A cidade se estende a grande distância e depois há uma floresta a perder de vista. Abaixo, carros, ônibus, pessoas em movimento. Tudo aberto e funcionando: crianças indo à escola, consumidores entrando e saindo das lojas, moradores abrindo e fechando as janelas, ora para ventilar os cômodos, ora para barrar a luz direta do sol. Mas você está aí, em pé sem dar um passo adiante num mundo cuja única regra é não parar.
Esta é a melhor forma de não viver: deixar de escolher, desistir dos objetivos, não cumprir com as necessidades e não se comprometer com as circunstâncias que lhe são apresentadas. A pessoa que não vive não decide e, por isso mesmo, não arrisca. Diria melhor: decide não arriscar pois, seja por comodismo ou trauma de um maldito evento passado, acredita ser melhor deixar o mundo andar por si mesmo. Mas não é.
Porque o mundo que anda assim o faz porque decide. É claro que as nuvens e mesmo os animais não decidem por si, vivem plenamente a condição de seu ser conforme lhes imputa sua natureza, mas há uma razão para as nuvens virem de leste e não de oeste e os pássaros voarem em bando e não sozinhos. Assim como há razão para sua inércia, nascida da apatia da vontade, da não decisão, ou melhor, da decisão de não viver. Só nós podemos escolher, atitude essencialmente humana e necessariamente moral: somos livres para trilhar o caminho do Bem e do Mal. Somos responsáveis pelo bem e o mal que fazemos, a começar a nós mesmos.
O caminho se abre a cada momento, a cada instante, e é definitivamente mau não decidir. Sabe aquela garota que você sonhava que um dia estaria contigo? Você não teve coragem e não fez nada ou não disse nada. Sequer tentou e agora está aí unicamente submerso em seus sonhos e desejos. Onde estão os seus amigos que há anos você não vê? Acreditou que a eles caberia a atitude de chamar para um encontro ou puxar uma conversa. Toda a atitude exigida dos outros é primeiro nossa, sempre. Você acha seu trabalho um porre e nem de longe imagina fazer o que mais lhe dá prazer? Abdicou de sua óbvia vocação profissional e preferiu seguir uma carreira mais segura. Ou ainda pior: deixou o trabalho de lado para apenas "fazer o que gosta". Nunca, jamais pare de trabalhar. Não há sonho sem sustentação material mínima, e não há sonho mais estúpido do que acreditar num trabalho de prazer constante ou viver unicamente de amor como se o sustento brotasse de bons sentimentos.
Não viver é uma decisão cujas implicações não são apenas materiais, mas morais, pois aqueles à sua volta vivem o fardo de seus erros, isso quando não têm de sustentar materialmente este erro. Viver começa por decidir, e a primeira luta está na contemplação do fardo, de sua própria cruz, de que ela nunca é tão pesada que não se possa carregar.
Um mundo que se move é um mundo vivo. No arrasto do tempo, até os cemitérios estão em movimento.
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